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06/04/2011, 16:09h | Notícias

Crianças desaparecidas

Estimativas apontam que todo ano 40 mil crianças e adolescentes são tidos como desaparecidos no Brasil. De acordo com especialistas no tema, 70% dos desaparecidos fogem de casa por problemas domésticos e cerca de 15% nunca mais reencontrarão suas famílias.

Os dados são apenas estimativas e geralmente resultam de iniciativas de organizações da sociedade civil ou pesquisadores envolvidos com a temática. Poucas são as secretarias de segurança estaduais que fazem o levantamento dos desaparecidos. São Paulo é um desses casos. Lá, entre crianças, adolescentes e adultos, foram registradas 20,2 mil queixas de pessoas desaparecidas em 2010. Desse total, 15,1 mil casos foram esclarecidos. No ano anterior, foram 19,7 mil registros de pessoas desaparecidas em todo o estado, com 16 mil casos esclarecidos.
Está aí a primeira deficiência brasileira ao tratar da questão dos desaparecidos: a falta de um banco de dados nacional e confiável.

O Cadastro Nacional de Desaparecidos foi oficializado na Lei 12.127/2009. Ele deveria ser a porta de entrada para inserção de informações sobre pessoas desaparecidas e para os devidos encaminhamentos junto aos órgãos competentes. No entanto, apesar de seu lançamento em fevereiro de 2010, ainda não existem dados oficiais para quantificar o número de crianças e adolescentes que desaparecem todos os anos no Brasil.

Ivanise Esperidião: "O que a gente nota é um descaso profundo e uma ausência de políticas"

Ivanise Esperidião: "O que a gente nota é um descaso profundo e uma ausência de políticas"

O Cadastro é de responsabilidade do Ministério da Justiça em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, e deveria ser abastecido por delegacias de polícia, com a colaboração de organizações não governamentais. Segundo o ministério, o Cadastro só funcionará efetivamente quando os delegados dos estados fornecerem informações. A explicação, no entanto, não é satisfatória para as famílias que há anos buscam seus entes desaparecidos. “A nossa busca é um esforço isolado e nossos filhos representam apenas números para a polícia. Há um ano foi lançado o Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas que não funciona e tudo que as autoridades fazem é jogar a responsabilidade de uma para a outra”, desabafa Ivanise Esperidião, mãe de uma filha desaparecida desde dezembro de 1995.

Busca isolada
Quando sua filha desapareceu, Ivanise não encontrou muitos recursos para auxiliá-la em sua busca. Foi nesse contexto que decidiu fundar, em São Paulo, a Associação Brasileira de Busca e Defesa da Criança Desaparecida, também conhecida como Mães da Sé. “O que a gente nota é um descaso profundo e uma ausência de políticas. Porque aqueles filhos não achados geralmente são de famílias pobres, então o poder público tem obrigação de fazer alguma coisa. Por isso criamos o movimento, para fortalecer esses pais que em comum têm o desejo de encontrar seus filhos vivos ou mortos”, explica.

A situação apontada por Ivanise se reflete na ausência de dados, mas também no descumprimento da lei. Poucos estados cumprem a lei nº 11259 / 2005, que determina a investigação imediata em caso de desaparecimento de criança ou adolescente, desobrigando a espera de 24 horas para o início das buscas. Segundo Ivanise, apenas Minas Gerais e Paraná cumprem essa determinação. “Conheço essa lei há seis anos, só dois estados cumprem. A mãe chega na delegacia e os delegados mandam voltar em 24h, porque elas não sabem do seu direito”, conta ela.

Políticas públicas
Em 2007, o número elevado de desaparecimentos de crianças e adolescentes motivou a abertura de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados. O relatório final da CPI foi divulgado em novembro do ano passado, apontando que a desintegração familiar é uma das principais causas de desaparecimentos. A CPI concluiu que “as políticas públicas para o enfrentamento dessa situação estão pulverizadas e não existe integração dos diversos agentes para solução do problema”.

No relatório final, a CPI busca indicar formas para o enfrentamento do problema. Um maior investimento de recursos por parte da União é tido como fundamental, juntamente com a adoção de tecnologias mais modernas. Diz o relatório: “já existem recursos científicos que poderiam ser empregados na solução dos chamados desaparecimentos enigmáticos, mas os órgãos públicos não os utilizam”. Outra ação apontada é a adoção de um banco de DNA juntamente com o cadastro nacional de desaparecidos.

O cadastro de DNA já é uma tecnologia desenvolvida no Brasil e estudada por diversos especialistas. Um exemplo é o projeto Caminho de Volta que trabalha na busca de crianças e adolescentes desaparecidos no estado de São Paulo. O projeto, pioneiro na criação do banco de DNA para crianças e adolescentes, tem atualmente mais de 800 famílias cadastradas e atende na 2° Delegacia de Pessoas Desaparecidas do Estado de São Paulo e na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

A professora Gilka Gattás: "Ainda estamos muito longe da solução do elevado número de desaparecimentos em nosso país". Foto: Osvaldo Ribeiro / Agência de Notícias do Estado do Paraná

A professora Gilka Gattás: "Ainda estamos muito longe da solução do elevado número de desaparecimentos em nosso país". Foto: Osvaldo Ribeiro / Agência de Notícias do Estado do Paraná

“É fundamental a identificação de uma criança ou adolescente pelo DNA principalmente se o tempo entre o desaparecimento e a localização for longo”, explica Gilka Gattás, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e coordenadora do projeto. Segundo ela, esta tecnologia também é oferecida no Paraná por meio de um convênio de expansão do Projeto Caminho de Volta.

Gilka conta que pelo banco de DNA já foram solucionados 6 casos, sendo quatro adolescentes encontrados mortos e duas crianças que estavam abrigadas. “Uma delas por mais de sete anos. Nesse caso em especial a criança era surda-muda e não sabia se comunicar”, explica.

Se o problema dos desaparecidos é uma causa urgente no Brasil, é preciso fazer se valer todas as ferramentas disponíveis para o seu enfrentamento, seja por meio das novas tecnologias, seja pela efetivação do que está determinado na lei. “Ainda estamos muito longe da solução do elevado número de desaparecimentos em nosso país. Uma maior comunicação entre os órgãos responsáveis pela busca dos desaparecidos é urgente. O conhecimento das possíveis causas com certeza permitirá, em um futuro próximo, políticas públicas voltadas para este problema que atinge um número tão grande de brasileiros”, conclui Gilka Gattás.

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