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01/06/2011, 17:38h | Juventude

Megaeventos e direito ao esporte

O Brasil segue com os preparativos para receber os megaeventos esportivos de 2014 e 2016. Nas cidades-sede, a luta contra o tempo para cumprir o cronograma de obras conta com ampla cobertura da imprensa nacional. Nem tão alardeada, entretanto, é a quantidade de dinheiro público investida na realização das competições. Estima-se que os gastos com a Copa e as Olimpíadas girem em torno de R$23bilhões e de R$25 a R$28bi, respectivamente.

Ainda que o assunto mais freqüente seja o andamento das obras, de outro lado, se torna cada vez mais intenso o debate sobre os legados dos megaeventos esportivos. Uma das discussões é exatamente sobre se os investimentos bilionários, efetivamente, trarão retornos ao povo brasileiro e desempenharão alguma função social nos anos seguintes a 2016. Outro ponto controverso é se a Copa e as Olimpíadas serão capazes deixar de herança uma cultura onde o esporte seja de fato encarado como direito e como meio de impulsionar o desenvolvimento infanto-juvenil.

Num país de 190milhões de habitantes, onde 60 milhões têm idade abaixo de 18 anos, não é difícil imaginar a importância de se fazer valer as leis que reconhecem o esporte como um direito da criança e do adolescente. Para muitos, os momentos que antecedem os megaeventos de 2014 e 2016 representam grandes chances de discutir questões como o papel do esporte na vida destes cidadãos – já que serão a parcela da população mais impactada pelos legados positivos e negativos das competições.

A Oficial de Proteção do Unicef, Ilaria Favero, diz que a chegada dos megaeventos é uma excelente oportunidade para que os próprios adolescentes debatam o esporte sob a perspectiva dos direitos. “A realização dos megaeventos representa uma grande oportunidade de envolvermos os adolescentes na discussão sobre o legado que eles podem deixar para a população, principalmente, quando o assunto é a garantia do direito ao esporte seguro e inclusivo para cada criança e cada adolescente brasileiro”, afirma.

No entanto, Favero adverte que muitos são os riscos de violações de direitos envolvidos em sediar competições como estas. “Por outro lado, se não forem bem estruturados e organizados, os megaeventos podem se tornar momentos nos quais crianças e adolescentes se exponham a situações de vulnerabilidade social. Em particular, preocupa o possível aumento da violência, abuso e exploração sexual, além do tráfico e trabalho infantil de crianças e adolescentes antes e durante os jogos”, explica.

Adolescentes no debate sobre o legado
Para discutir o legado social dos megaeventos e sua relação com o direito de crianças e adolescentes ao esporte, o Unicef realizou, em abril deste ano, o “Encontro dos Adolescentes pelo Direito ao Esporte Seguro e Inclusivo”. O evento, que aconteceu no Rio de Janeiro, reuniu 202 adolescente de 11 estados e do Distrito Federal e terminou com a elaboração de um documento com suas demandas a respeito da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Leonardo Nunes, jovem atleta do Rio de Janeiro, foi um dos participantes do encontro. Para ele, embora o evento tenha sido uma boa oportunidade para o desenvolvimento e troca de idéias sobre o tema, a carta-manifesto que resultou das discussões deixou a desejar. “A carta ficou macia aos ouvidos das autoridades. Estávamos ali para dizer que os adolescentes estão cientes de tudo que está acontecendo e do que vai acontecer quando acabarem os megaeventos. Questões como a corrupção, por exemplo, tinham que estar entre os pontos principais”, argumenta Leandro.

O atleta não nutre muitas esperanças sobre o que os megaeventos deixarão para a população. “O legado vai ficar para o turismo, para as empresas, federações e políticos. E pro povo nada. Vamos continuar a ter que pagar ingressos caros para entrar nos estádios. É um evento para europeu fora da Europa”, critica.

Para a Oficial de proteção do Unicef a projeção que a Copa e as Olimpíadas trará para o Brasil deve ser aproveitada. “Os jogos terão grande visibilidade no mundo inteiro e oferecem, portanto, uma excelente oportunidade de mobilização da população brasileira para a importância do esporte seguro, inclusivo e solidário, para todos, respeitando as diversidades de cada criança e cada adolescente. A realização dos megaeventos esportivos pode ser também um fator importante para a mobilização de esforços e recursos na área de esporte para crianças e adolescentes. Recursos e esforços que não seriam disponibilizados ou que demandariam um período muito mais longo para se materializarem”, ressalta Favero.

O “Encontro dos Adolescentes pelo Direito ao Esporte Seguro e Inclusivo” além da carta-manifesto, deu origem a uma articulação para acompanhar a pauta dos megaeventos. “Durante o encontro foi criada a Rede Nacional de Adolescentes e Jovens pelo Direito ao Esporte Inclusivo, que vai realizar debates locais sobre a questão e deve construir atividades que tenham a ver com o monitoramento da gestão pública. Uma questão bastante levantada no encontro por parte dos adolescentes foi o orçamento”, diz Fransérgio Goulart, representante do Centro de Promoção da Saúde (Cedaps), instituição parceira do Unicef no evento.

Riscos
Não são poucos os riscos que os megaeventos esportivos representam para os direitos da criança e do adolescente. Como aponta a Oficial de Proteção do Unicef, o quadro de exploração do trabalho infanto-juvenil pode piorar – sobretudo, o de exploração sexual. Além disso, a falta de diálogo entre Estado e os jovens nesta fase de preparação pode trazer como conseqüência o reforço de um modelo elitista que continuará a dificultar a participação de crianças e adolescentes em práticas esportivas inclusivas.

Segundo Fransérgio Goulart, só o diálogo pode produzir um legado que não se restrinja à esfera econômica e ao lucro em última instância. “Reforçam a idéia de cidade partida, quando colocam as UPPs apenas em áreas do entorno dos locais onde acontecerão os jogos; quando despejam famílias de seus locais de moradia para a construção de equipamentos esportivos. Todos estes riscos de violações e violações de fato podem ser minorados se conseguirmos efetivar um diálogo franco e aberto dos adolescentes/jovens e movimentos sociais com o Estado. Só assim se pode viabilizar um projeto de Legado Social, no qual o econômico é uma das partes, mas não a principal. Caso contrário, vamos ter um legado de precariedades”, lembra o representante do Cedaps.

Conhecendo todos estes problemas e pouco esperançoso quanto ao legado positivo dos megaeventos, o jovem atleta Leonardo Nunes mostra que sua crença no esporte não foi abalada. “O esporte para mim é tudo. É uma válvula de escape. Nele, ninguém é rico ou pobre, é atleta. O esporte é muito inclusivo, mas nem todos estão incluídos”, diz o, adolescente, sempre crítico.

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