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01/02/2012, 18:40h | Notícias

LDB: os primeiros 50 anos do desafio

Por Raika Julie

A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira foi promulgada em 1961 e, dentre outras ações, estabelece os princípios educacionais e os deveres do Estado em relação à educação escolar pública, definindo as responsabilidades, em regime de colaboração, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Tais diretrizes são baseadas nos artigos 205 a 214 da Constituição Federal, que estabelecem preceitos acerca das responsabilidades estatais relativas a educação.

A atual LDB (Lei 9394/96), sancionada em 20 de dezembro de 1996, baseia-se – prioritariamente – no princípio do direito universal à educação para todos e apresenta diversas mudanças em relação às leis anteriores, como a inclusão da educação infantil (creches e pré-escolas) como primeira etapa da educação básica.

Quando se compara a realidade da educação brasileira com o que está previsto em lei é possível perceber o abismo entre as duas realidades. “Sou professora da rede pública de ensino há 23 anos e meu maior desejo é ver o cumprimento efetivo da LDB. A sensação que tenho é que caminhamos a passos lentos neste caminho”, diz Odete Vieira, educadora.

A doutora em Serviço Social e diretora da ONG Redes de Desenvolvimento da Maré, Eblin Farage, explica que a LDB se torna um marco quando ela reafirma a universalização da educação brasileira, garantindo a igualdade de aprendizagem e formação para todos os cidadãos. “Sem dúvidas, avançamos muito quando a lei reitera este princípio básico e fundamental. Porém, nas duas últimas décadas, embora tenha ocorrido uma expansão da educação, infelizmente, também presenciamos a baixa qualidade do ensino presente em todo este processo”.

Educação e Território

De acordo com dados do Ministério da Educação, em 2008, 23% dos brasileiros, entre 15 e 29 anos de idade, considerados analfabetos funcionais, eram – em sua maioria – residentes em periferias ou bairros considerados de classe média baixa. Para Eblin, em geral, estes dados vão ao encontro da realidade das escolas existentes em muitos outros territórios populares. “Se analisamos o ensino público nas favelas cariocas a situação educacional, em comparação com demais territórios, é ainda mais precária. Normalmente, há insuficiência de profissionais e a infraestrutura do espaço escolar também costuma ser decadente, dentre muitos outros problemas”.

A assistente administrativa, Kátia Santana, conta que sentiu muita diferença entre as escolas existentes na favela em comparação com as de outros territórios. “Minha filha, até a 4ª série, estudou em uma escola dentro da favela e, volta e meia, as aulas eram canceladas ou por falta d’água, ou falta de professor. Fora as aulas que eram suspensas devido a violência ou tiroteios, o que nos causava desespero e levava um tempo para reconhecer a escola como um espaço seguro novamente”.

Situações como estas atingem todo o contexto escolar. “Eu tenho vários colegas de profissão que desistiram de lecionar em determinado bairro por causa da violência ou porque a escola não oferecia estruturas adequadas de trabalho. Quando você trabalha em mais de uma escola, as diferenças ficam muito evidentes. Há profissionais que ficam traumatizados, alunos que abandonam a escola por medo ou você vê a escola toda perdendo ritmo e ânimo. Enquanto em outros locais, muitas vezes, essas características são quase inexistentes. Nestas horas, a sensação que tenho é que a LDB e todas as demais leis que garantem os Direitos Humanos não são suficientes porque não conseguimos aplica-las no cotidiano. Parece que tudo é só mais um documento”, desabafa Odete.

Ainda que os fatos relatados nos remetam a sensação de que o cumprimento da LDB está distante da realidade de muitos brasileiros, Eblin acredita que o reconhecimento da especificidade de cada espaço escolar possa ser um primeiro passo. “É fundamental saber, em detalhes, as características da região onde está cada escola, conhecer os profissionais e alunos que ali estão e garantir um diálogo permanente entre as autoridades responsáveis pelo sistema educacional e as pessoas que desenvolvem as metodologias na prática. Aí sim, se está mais próximo da igualdade na educação que tanto se almeja, mas pouco se alcança. Da forma que está, o que vemos dia após dia, é a educação como um todo ser atingida pela violência e isso ser usado como justificativa da baixa qualidade do ensino, o fechamento das escolas, dentre outros problemas”.

LBD: há o que comemorar?

Eblin explica que a Lei de Diretrizes e Bases, embora seja uma conquista e deva ser valorizada e reconhecida, se difere, consideravelmente, do que foi proposto e reivindicado pelos profissionais da educação. “Foram feitos muitos acordos, o que engessou a proposta original feita por professores e demais profissionais do ramo, mas a LDB é a reafirmação histórica da garantia do direito à educação. O grande desafio que temos na atualidade é pensar a educação para além do formato secular. Precisamos defender uma educação que tenha interface com outros setores, que seja pensada, em conjunto, com as demais políticas públicas existentes. Do contrário, corremos o risco de ver a continuidade destes primeiros 50 anos”, finaliza.

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