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06/09/2011, 14:58h | Entrevistas, Notícias

Refúgio e Cidadania

Por Raika Julie

No final de 2010, havia 43,7 milhões de pessoas forçadas a se deslocar em todo o mundo, o maior número dos últimos 15 anos. Dessas, 10,5 milhões são refugiadas e estão sob o mandato do Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR). O relatório apresentado pela entidade mostra mudanças no ambiente de proteção que existia há 60 anos, quando o ACNUR foi criado. Naquela época, a agência da ONU para refugiados atendia 2,1 milhões de casos na Europa, de pessoas que foram obrigadas a se deslocar por causa da II Guerra Mundial. Atualmente, o trabalho do ACNUR se estende a mais de 120 países e engloba tanto pessoas obrigadas a ultrapassar as fronteiras de seu país quanto àquelas que se deslocam dentro de seu território – os chamados deslocados internos.

O quadro geral também inclui 837.500 solicitantes de refúgio e 27,5 milhões de deslocados internos. “O relatório revela um grande desequilíbrio no apoio internacional às pessoas que foram forçadas a se deslocar, sendo que 80% dos refugiados do mundo foram acolhidos por países em desenvolvimento, no momento em que cresce o sentimento anti-refugiado em muitos dos países industrializados. É importante lembrar que o refugiado não está abrindo mão de sua cidadania, nem de seu território”, explica o porta-voz do ACNUR, Luiz Fernando Godinho, em entrevista ao Notícias & Análises, do Observatório de Favelas.

Notícias & Análises: Há um perfil étnico-racial predominante, em se tratando dos refugiados no mundo hoje? Que perfil é esse?
Luiz Fernando Godinho: A Acnur não faz este recorte étnico, diretamente. Em geral, os refugiados deixam seus países de origem devido a conflitos políticos, sociais e/ou religiosos que tornam a permanência naquele local insustentável e repleta de insegurança. Há também os grupos que buscam melhores condições sócio-econômicas e/ou trabalhistas, por não encontrarem nenhuma perspectiva de crescimento no local onde estão. O refúgio normalmente se dá após uma série de tentativas frustradas de mudança e transformação do contexto em que se vive, seja ele social, econômico, político ou qualquer outro.

"Ser refugiado não significa abrir mão da cidadania", explica o porta-voz do ACNUR, Luiz Fernando Godinho

"Ser refugiado não significa abrir mão da cidadania", explica o porta-voz do ACNUR, Luiz Fernando Godinho

N&A: Racismo, colonialismo e demais iniciativas excludentes são fatores que influenciam essa situação?
FG: O que nós, inicialmente, buscamos detectar é a origem do conflito que levou o cidadão a se tornar um refugiado. Países onde há uma maior incidência contínua de conflitos sejam eles de distintas origens, como por exemplo, Iraque e Afeganistão, entre outros, historicamente lideram o ranking do número de refugiados, pois são anos e anos de guerra, de conflitos e limitação ou anulação de direitos comuns. Obviamente que situações onde a liberdade é restrita e os regimes ditatoriais são predominantes, facilitam e influenciam esta questão.

N&A: Em relatório recente, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR), dá conta de que a experiência de ser refugiado se torna cada vez mais duradoura para milhões de pessoas ao redor do mundo. Alguns estão no exílio há mais de 30 anos. Há uma estimativa de quantos são os filhos – crianças e adolescentes – desta geração de refugiados?

FG: Não é possível quantificar estes dados, porém, se considerarmos que neste período muitos refugiados tentam reconstruir suas vidas e saírem deste estado permanente de espera, isso pode significar que eles busquem novas redes sociais que vão desde o grupo de amigos até mesmo a reconstituição familiar no local onde se encontra no período.

N&A: Como ficam os direitos das crianças, adolescentes e jovens nascidos neste contexto?
FG: Estes direitos são garantidos por convenções e tratados internacionais e, também, está de acordo com a legislação de cada país. Por exemplo, no Brasil, a lei garante que toda pessoa nascida neste território, é brasileira, sem nenhuma restrição e com os mesmos direitos garantidos para todos os cidadãos.

N&A: De 1998 até o ano passado, calcula-se que chegue a 16mil o número de mortos na tentativa de deixar a África e chegar até a Europa através do Mediterrâneo. Como evitar que, por exemplo, esse número continue aumentando, se as pessoas preferem apostar suas vidas numa travessia a permanecer em seus territórios de origem?
FG: A primeira medida seria a redução dos conflitos internos ou externos, que é o principal motivo que leva alguém a se refugiar. Depois, vem a concentração da comunidade internacional em acolher os refugiados. É preciso que haja um aumento das cotas de reassentamento e que as negociações de paz em situações de conflitam sejam mais aceleradas para permitir que o refugiado volte para casa. O refugiado vive em um eterno estado de espera. É importante destacar que refúgio não é abrir mão da própria cidadania. É uma condição transitória, embora muitas vezes, longa, que não se classifica pela busca de uma nova nacionalidade, mas sim, pela imposição de uma situação onde – naquele momento – a solução mais sábia era deixar o país de origem, mas não a própria história.

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